John Ford
The Informer de John Ford são fluxos de sombras de implacabilidade a rasgar o ecrã uma e outra e outra vez incessantemente, qualquer coisa tão feroz e tão brutal quanto a culpa da traição que remói e remói a consciência do homem. Tudo é arrancado às trevas que as traz com ela (com a culpa) para naquela noite, negra de tão negra quanto a morte e quanto a névoa tão cerrada que paira pela cidade e que turva qualquer visão que possa resplandecer na multidão, assombrar o mundo e aquele homem que por um impulso que veio da fome e, acima de qualquer coisa, do amor, trai o melhor amigo condenando-o assim ao destino fatídico a que assistimos. Sobre ele cairá toda a culpa do mundo e sobretudo todas as trevas que se possam imaginar, nada de fugacidades ou de implicações fugidias, tudo é tão interminável quanto a certeza da morte, tudo é tão perpetuamente terrífico na certeza do destino que foi e daquele que virá, abrupto e irrompido tanto da traição quanto da morte, nas sombras da bruma (que poucas vezes tão bem exprimiu as trevas do mundo) cerrada que amaldiçoa aquela noite maldita naquele submundo duma Dublin a ferro e fogo com o jugo inglês. Não admira portanto, em tempo de sublevações e resistências obscuras, a desmesurada magnitude que a palavra traição assume. Gypo, o judas da história, não só traiu o amigo como traiu a causa, tem, por isso, de ser forçosamente eliminado. E é ele próprio, dominado pelo medo e pelo martírio da culpa, que aos poucos e poucos (e com a ajuda do álcool) se vai “entregando” (ou denunciando) à organização. Grandioso.
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