7 de abril de 2011

Central do Brasil (1998)
Walter Salles

Central do Brasil é filme da descoberta. Tudo o que se queira chamar de compaixão, de amizade, de afecto, tudo que se possa assemelhar a isso está lá, ali naquele Brasil do nordeste, das aldeias e do fim do mundo. Tanto humanismo que se rejeita naquela azáfama citadina e que se (re)descobre naquela viagem , tanta ternura no meio de tanta miséria. Central do Brasil é uma história do reencontro interior, duma segunda oportunidade, da reconquista da alma, da perda do medo dos fantasmas do passado, a procura do afecto e da aniquilação da solidão interior. Coisa simples que abrange o mundo, a humanidade, o tempo. Central do Brasil é qualquer coisa tão bela e tão emotiva que a poucos é possível. Beleza cristalina da candura da infância que força a descoberta ou a auto-descoberta, o tempo que arrasta a ternura e esse humanismo tão presente como tão tempestuoso, relação tempestuosa entre aquela professora reformada e aquela criança que perde a mãe tão brutalmente e abruptamente que culmina nessa conquista desses laços tão fortes e tão sólidos que naquele final se revelam, a beleza daquela poeira amarela do nordeste brasileiro, da desertificação do nordeste, das localidades. A busca daquela criança pelo pai é a fé e a esperança que desapareceu em Dora, causa do tempo, da dor que o tempo traz, da resignação que o ser humano normalmente aceita. Aquela viagem é essa redescoberta da esperança, do amor paternal, da rejeição do esquecimento. Provavelmente o melhor filme brasileiro que vi até hoje.

7 comentários:

Sam disse...

É um óptimo filme, mas não o considero o melhor título brasileiro de sempre :)

Para mim, esse estatuto pertence a PIXOTE, do Hector Babenco.

Cumps cinéfilos.

Álvaro Martins disse...

Não disse isso Sam, nem o posso dizer pois conheço muito pouco cinema brasileiro.

Não, nunca vi João. Fica a recomendação ;)

Enaldo Soares disse...

Como brasileiro sinto-me à vontade para falar: ninguém aqui,salvo melhor informação, o colocaria em uma lista dos cem melhores filmes brasileiros. O sucesso junto ao público se deu pela possível indicação ao Oscar, e um pouco pela atriz Fernanda Montenegro, considerada a "Grande Dama do Teatro Brasileiro".

Um filme brasileiro que eu considero digno deste blog é "Limite" de Mário Peixoto (1931),um clássico do expressionismo nacional, infelizmente pouco citado pelos cinéfilos locais, que preferem o politizado Cinema Novo,com Nélson Pereira dos Santos e Gláuber Rocha, dentre outros.

O cinema brasileiro voltou a ter reconhecimento a partir de Quatrilho (1992) e Carlota Joaquina (1994). Hoje é possível assistir a uma meia dúzia de bons filmes brasileiros por ano.

O melhor filme brasileiro, ainda que a intelectualidade de esquerda lhe torça o nariz, para mim, é Tropa de Elite (1 e 2), partindo do princípio de que se o cineasta não dá uma aula de estética e fotografia, pode, no entanto, contar uma boa estória que convença o espectador a enfrentar as salas de cinema com o mal-educado público contemporâneo.

Álvaro Martins disse...

Pois Enaldo, como já disse, conheço pouco cinema brasileiro, e até posso estar a dizer uma grande asneira, mas já vi o Tropa de Elite (o primeiro) e quanto a mim não chega aos calcanhares deste, aliás, o Tropa de Elite (que até não desgostei de todo) e o pouco do cinema brasileiro contemporâneo que conheço parece-me emergido no espectro de Cidade de Deus numa espécie de herdeiros deste.

Nunca tinha ouvido falar nesse Limite ao contrário do Quatrilho e Carlota Joaquina que já li qualquer coisa sobre eles. Ficam mais recomendações :)

Já agora que me dizes de Lavoura Arcaica? É um dos que tenho aqui para ver e do qual sinto muita curiosidade.

My One Thousand Movies disse...

Eu gosto muito do Vidas Secas e do Terra em Transe.
Álvaro, tenho o "Limite" no meu blog ;)

Álvaro Martins disse...

Ainda bem Chico, já vou ver o dito filme mais cedo do que esperava eheh, esse Terra em Transe também tenho cá por aqui para ver, falta é tempo para ver tanto filme!

Enaldo Soares disse...

Caro Álvaro Martins.

Estás a ter razão quanto à filiação de Tropa de Elite à Cidade de Deus, sem dúvida.

Nunca tinha ouvido falar de Lavoura Arcaica, mas devo assisti-lo em função de Selton Mello, que já fez vários filmes interessantes,como "Meu nome não é Johnny", o "Auto da Compadecida" e outros.

Não sou fã do cinema brasileiro, e no final do regime militar aguentei muito patrulhamento ideológico de colegas por preferir cinema e música europeia aos similares nacionais.

Um título como Lavoura Arcaica me traz imagens muito estereotipadas, algo assim como se vocês fossem ao cinema e lá estivesse a passar "Uma tristeza de fado" ou "O menino dos pastéis de Belém", por exemplo.

A menos que colegas me indiquem o filme por trazer algo muito inovador,eu fujo de temáticas muito surradas da cultura brasileira: o êxodo rural, a Bahia de todos os santos, o carnaval, o gênio do futebol, etc.

Há uma geração nova de produtores de curtas brasileiros que prometem. Mas creio que a tendência do cinema brasileiro é a universalização (outros diriam globalização, ou capitulação à Hollywood, veremos). Afinal, mesmo em desvalorização, euros e dólares ainda contam mais que os nossos reais.

Um abraço a todos.