Novamente sobre o novo Aronofsky, aquilo que me desiludiu não foi a (sua) forma de fazer cinema, os tais planos ultra-rápidos, a tal veia dos videoclips. Isso não é defeito, bem pelo contrário. Não, isso já no Pi o fazia. O que me desilude em Black Swan é a pretensão existente, a confusão de géneros que se cria (a desnecessária, ilusória e absurda recorrência ao ambiente obscuro e de tensão na aproximação do thriller psicológico), a euforia com que se filma que não é correspondida pelos actores (excepto Natalie Portman). Analisemos:
O que Black Swan conta é a história duma rapariguinha que finalmente (após muitos anos de trabalho, dedicação e obsessão ao ballet) consegue o papel principal (o dos cisnes branco e negro) na peça de Tchaikovsky, O Lago dos Cisnes. Até aqui tudo bem. O problema chega com a atribuição duma ambiguidade e complexidade ao conflito interior em que Nina incorre. E isto porque aquilo em que Aronofsky mergulha é numa salgalhada de misticismos e confusões de géneros (thriller, drama, romance), onde os seus esforços se dirigem para uma relação intensa e vulgar entre a peça e a evidente demência de Nina. A interpretação do Cassel deixa muito a desejar. Não há profundidade nas personagens, ao contrário do que existe com o conflito interior que assola Nina, o qual é exaustivamente explorado e absurdamente relacionado com a peça de Tchaikovsky. Porque esta ligação que Aronofsky atribui à peça e a Nina vem trazer uma obscuridade alheia à história, vem trazer o suspense, o thriller numa história que assim não o reclama. Pelo menos é assim que eu vejo o filme. Tanta euforia para quê? Toda aquela confusão mental esmiuçadinha para quê? O filme não é mau, donde veio até não está nada mau. Mas para mim nada mais que isso.
O que Black Swan conta é a história duma rapariguinha que finalmente (após muitos anos de trabalho, dedicação e obsessão ao ballet) consegue o papel principal (o dos cisnes branco e negro) na peça de Tchaikovsky, O Lago dos Cisnes. Até aqui tudo bem. O problema chega com a atribuição duma ambiguidade e complexidade ao conflito interior em que Nina incorre. E isto porque aquilo em que Aronofsky mergulha é numa salgalhada de misticismos e confusões de géneros (thriller, drama, romance), onde os seus esforços se dirigem para uma relação intensa e vulgar entre a peça e a evidente demência de Nina. A interpretação do Cassel deixa muito a desejar. Não há profundidade nas personagens, ao contrário do que existe com o conflito interior que assola Nina, o qual é exaustivamente explorado e absurdamente relacionado com a peça de Tchaikovsky. Porque esta ligação que Aronofsky atribui à peça e a Nina vem trazer uma obscuridade alheia à história, vem trazer o suspense, o thriller numa história que assim não o reclama. Pelo menos é assim que eu vejo o filme. Tanta euforia para quê? Toda aquela confusão mental esmiuçadinha para quê? O filme não é mau, donde veio até não está nada mau. Mas para mim nada mais que isso.
13 comentários:
Acredita, Álvaro, que a "técnica videoclip" é mesmo defeito. Pelo menos em Cinema. Sabendo-te um grande apreciador do cinema de Tarkovsky, por exemplo, como é que consegues conciliar duas coisas tão antagónicas?
O Rato Cinéfilo
Como consegue conciliar?
Eu acho que a pluralidade não é defeito e sim qualidade!
Eu não consigo ver 50 filmes iguais! Quero diferença!
Como se pode gostar apenas de uma estética? Como se pode renegar as qualidades de uma outra corrente da mesma arte?
Será impossivel conciliar e gostar de coisas como Dali, Picasso, Van Gogh, Warhol ou Munch?
Será que temos de ser fanáticos de um só género musical? Seguir apenas o rock e renegar a deriva e os caminhos imprevistos do jazz? Não apreciar as texturas da electrónica ou o serialismo minimalista?
E quanto a Siza Vieira ou Niemeyer?
Cinema foi só Welles, Hawks, Ford e Chaplin?
Eu sou pela diferença e pelo antagonismo de géneros!
Rato, a resposta à tua pergunta deu-a o Neuroticon ;)
"Como se pode renegar as qualidades de uma outra corrente da mesma arte?"
Perfeitamente de acordo, caro Neuroticon, dizes muito bem, da "mesma arte". E todos os exemplos que apontas são perfeitamente legítimos.
Só que, para mim, Aronofsky é de outro campeonato, não pisa os mesmos terrenos. E não chamaria de "fanáticos" quem nas diversas formas de arte aprecia apenas algumas "correntes". Na música, por exemplo, as minhas preferências são até bastante ecléticas, vão desde a clássica ao rock da pesada. Mas não suporto o "hip-hop" por exemplo. Sou "fanático" por essa exclusão? Então seremos todos um pouco "fanáticos", pois se há coisa em que não acredito é na uniformidade de gostos, de políticas, de formas de ver e pensar o mundo à nossa volta.
E, como já deves ter percebido, considero o Aronofsky o "hip-hop" do cinema...
Também detesto hip-hop, trance, drum and bass, e por aí fora eheh
Mas as coisas não podem ser assim tão lineares Rato. Claro que há excepções, tem de haver posições, preferências e exclusões em qualquer forma de arte. Claro que não dou o mesmo valor ao Aronofsky que dou ao Tarkovsky, ou ao Tarr, ou ao Sokurov ou ao Dumont. Mas isso não me obriga a não dar o devido valor ao Aronofsky (que convenhamos ultrapassa qualquer Scott ou Bay), como não me impede de dar o devido valor (por exemplo) ao mais mainstream dos cineastas de hollywood (e um dos meus ódios de estimação eheh), Spielberg (pelo que fez outrora, pela sua influência no panorama cinematográfico actual...). O problema do Aronofsky (a meu ver) não é essa linguagem própria que o caracteriza (isso é legítimo, é no fim de contas trabalho cinematográfico, inovação, porque são planos e enquadramentos (alguns) fantásticos, são formas frenéticas de conciliar o som com a imagem (quando o consegue), com a sua dose de visionário), o problema do homem é o problema do Scott ou do Nolan ou do Cameron, enfim, o problema do actual cinema made in hollywood, o rebuscamento, o embelezamento da imagem, os artifícios. Isto porque crueza, contemplação, secura, apelo ao intelecto, etc, não vende. E quem trabalha em hollywood se não vender está fodido.
João, o som ( aliás, a parte técnica dos filmes de Aronofsky (e de hollywood) é sempre bom, daí nem me ter lembrado :)
qualquer dia revejo o filme para ver se mudo de opinião (mas duvido eheh).
A verdade, Álvaro, é que até a chamada "técnica de video-clip" não é original. Como o próprio nome indica ela apareceu nos inícios dos anos 80, altura em que tanto quanto julgo saber ainda não eras nascido. Mas eu lembro-me bem desses anos, sobretudo de um programa chamado "The Final Countdown" que veio revolucionar o modo como a música era mostrada/consumida no pequeno écran. Essa técnica de filmagem contribuíu para lançar muitas bandas daqueles anos e provavelmente ainda terei para aí várias cassetes VHS com gravações desses video-clips.
Muitas das pessoas que filmavam essas pequenas encenações musicais e também filmes publicitários viraram mais tarde realizadores de cinema. Aronofsky foi um deles. Muitos conseguiram libertar-se da ditadura dos 3 segundos (que é aproximadamente o tempo que dura cada plano) mas outros transportaram para o cinema essa aprendizagem inicial. Uma década depois esses realizadores eram conhecidos pejorativamente (em termos cinéfilos) como a "geração-clip".
Se essa técnica funcionava às mil maravilhas nos spots musicais ou comerciais era porque esses duravam apenas 3 ou 4 minutos e tinham de cumprir a sua missão (vender uma imagem, uma música, um produto) nesse curto espaço de tempo. Agora, utilizar essa mesma técnica, como o Aronofsky faz, numa longa-metragem de duas horas é que se torna deveras insuportável, ainda por cima com toda a carga de pretensiosismo que ele adiciona.
Por acaso Rato, foi no início dessa década que nasci, mais propriamente em 83. Mas isso também não é relevante para o que quer que seja Rato. Acho que tens de te libertar dessa presunção de seres da “velha guarda” que assumes constantemente face aos outros eheh (sem querer ofender atenção).
Não acho que a tal técnica do videoclip (que diga-se, também não sou grande adepto mas não a rejeito totalmente) seja insuportável numa longa-metragem (isto sem que se abuse dessa mesma técnica). Acho que são formas de fazer cinema, que às vezes resultam e outras vezes não, embora não se possa dar o mesmo valor que a um plano-sequência (por exemplo).
Com o pretensiosismo sim, aí concordo em absoluto, com a sua tentativa ridícula que vem do The Fountain (e um pouco no Requiem) de transcender, de intelectualizar, de enaltecer o objecto em questão (que nada tem em comum com essa pretensa transcendência). A meu ver (e que me lembre agora) só há duas coisas que tornam possível (e que resultam) uma transcendência no cinema, a fé e a natureza.
Quanto ao resto, à história do videoclip, confesso que não estava muito dentro do assunto. Já agora, obrigado pela informação ;)
Por acaso não tenho a noção de ter qualquer "presunção" relativamente à minha geração. Limito-me a usufruir de uma maior experiência e tentar passá-la aos mais novos, é só isso. Mas como são os outros que nos vêm melhor até é possível, não sei. A verdade é que não tenho consciência disso.
De qualquer modo trocava de boa vontade alguns anitos contigo :)
Acredito Rato ;)
Concordo perfeitamente com o João.
Continuo sem compreender o que queres dizer com "pretenciosismo" e não concordo que as personagens não tenham personalidade. Eu ainda agora não sei se a Lily é boa ou má. E o que dizes da evolução das atitudes da mãe da Nina ?
De resto, acho que estás a fazer um raciocínio ao contrário e a forçar algo que não dá para forçar.
O facto de o filme ser um "thriller" é uma das premissas que lhe está na génese, do argumento à concepção visual do Aronofsky. Não é uma conclusão, um resultado, que esteja mal tirado. Não acho que possas dizer que aquela história não precisava de suspense porque a história é uma história de suspense e esquizofrenia. Óbvio que se quisesses podias fazer dela um romance ou até um musical.
DiogoF, o problema não é ser um thriller, o problema é a relação, ou a ligação, que se estabelece entre a tal esquizofrenia e a peça de ballet. Cria-se ali um misticismo, uma espécie de exteriorização (ou interioriazação visto ser um conflito interior) dos fantasmas que assombram Nina. Isso é que eu acho que era escusado. Ninguém é mau e ninguém é bom, isso sim acho que Aronofsky deixou bem claro, é tudo fruto da esquizofrenia, da imaginação dela. E sim, acho que pretende enaltecer toda aquela história (e a peça de Tchaikovsky ainda mais), transcendê-la quando é uma simples história vertiginosa da queda da sanidade mental duma bailarina.
Gostei bastante. Que filme magistral.
Cumps.
Roberto Simões
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