"Inglourious Basterds" foi finalmente apresentado em Cannes. Quentin Tarantino, ao que parece, frisou "There's no place like Cannes para os realizadores à face da Terra", lá nisso tem razão, e continuou dizendo que não se assume como realizador americano "mas como realizador de filmes para todo o planeta".
Vasco Câmara, do Público, escreve ainda assim sobre "Inglourious Basterds": "Inglourious Basterds é o tal projecto que Tarantino andou a escrever durante oito anos. Seria, supostamente, um remake do filme de Enzo Castellari, de 1978, Inglourious Bastards, que para Quentin faz figura de emblema de um subgénero dentro do género filme de guerra: o bunch of guys in a mission movie, o "filme de um grupo em missão". Na verdade, o filme de Tarantino não é um remake. É outra a sua natureza. Não é por acaso que o título do filme de Castellari se refere aos bastards e o de Tarantino aos basterds. Não há gralha. É o preciosismo (mais disto à frente...) que faz a diferença: Tarantino recria não um filme, mas uma ideia de cinema e de género. Onde cabem - funciona assim com ele - todos os filmes em potência.
Cada segmento de Inglourious Basterds - ou deveríamos falar em "capítulos", como num romance? - é escrito, desenvolvido, filmado, montado como um filme autónomo, ou com potencial, de personagens, de narrativa, para se desenvolver como um filme autónomo. Cada um expondo e revelando ao que vem como quem abre uma caixa de surpresas. E assim passamos de capítulo em capítulo, de golpe de teatro em golpe de teatro, numa progressão a que só não sucumbimos exaustos porque Quentin é mais caloroso do que exibicionista e filma com papel e caneta, como quem escreve o seu romance. Contagiante e inteligente espectáculo este. Que, em vez de ser espectáculo da acção, é espectáculo da palavra. Os diálogos e as legendas são a matéria do drama, a matéria com que se faz a II Guerra em Inglourious Basterds. Que é um filme falado tanto em francês como em alemão, como em inglês. Onde quem sabe as línguas todas está em condições de dominar (mas tanta legendagem complicará a vida aos americanos, isso é mais que certo)."
Ou seja, Vasco Câmara fala muito bem do último Tarantino. Confesso que estava um tanto céptico quanto a este "Inglourious Basterds", mas sendo assim, e esperemos mais opiniões, fico ainda mais curioso e expectante.
Para rematar, o crítico do Público escreve: "E agora, uma frequently asked question de 2009: porque é que bastards deu em basterds, qual é a coisa do "e"? "É um floreado artístico que não posso explicar. Jean-Michel Basquiat tirou um L da palavra Hotel e colocou-o num quadro seu. Se ele fosse a explicar porque é que fez isso..." Não é preciso dizer mais..."
E se por um lado temos Tarantino, um dos nomes mais sonantes do "novo cinema", por outro temos um vanguardista, um nome aclamado e respeitado na história do cinema, um senhor que pisou pela primeira vez Cannes há 50 anos, Alain Resnais. "Les Herbes Folles" é o seu novo trabalho e ao que parece, traz um Resnais actual.
Mais uma vez, Vasco Câmara diz: "Pelo contrário, é muito mal educado, porque é inclassificável, Les Herbes Folles, de Alain Resnais, (...) Mas Alain Resnais é um cineasta de hoje. Com os seus actores habituais (Sabine Azéma e André Dussolier) a liderarem um cast onde está uma outra geração de intérpretes franceses, como Emmanuelle Devos, Mathieu Amalric ou Sarah Forestier, e sempre a partir de um material dramatúrgico, quer seja romance ou peça de teatro, que não tem problemas em habitar zonas contíguas aos encontros/desencontros da comédia de boulevard, Resnais filma a formação (e aniquilação violenta) de um par.
O acaso, o roubo de uma carteira, coloca Azéma e Dussolier, que tudo, até a idade, indicaria estarem sentimentalmente "arrumados", em rota de colisão (é literal, a comédia vira tragédia). Como se seguisse um fio em que a loucura se vai improvisando, à imagem da vegetação que teima em crescer, espontaneamente, nas fendas do cimento, Resnais segue essa história de desordem - como lhe chamar: de amor? Resnais escreve, pinta e gesticula com o seu cinema, com a sua câmara. Faz teatro, faz filme caseiro e faz produção da Hollywood clássica, simulando "happy ends" sinfónicos. Faz um filme não domesticado, selvagem."
E dito isto, o que esperar? Resnais é Resnais e confesso que dou preferência a este em detrimento de Tarantino.
Vasco Câmara, do Público, escreve ainda assim sobre "Inglourious Basterds": "Inglourious Basterds é o tal projecto que Tarantino andou a escrever durante oito anos. Seria, supostamente, um remake do filme de Enzo Castellari, de 1978, Inglourious Bastards, que para Quentin faz figura de emblema de um subgénero dentro do género filme de guerra: o bunch of guys in a mission movie, o "filme de um grupo em missão". Na verdade, o filme de Tarantino não é um remake. É outra a sua natureza. Não é por acaso que o título do filme de Castellari se refere aos bastards e o de Tarantino aos basterds. Não há gralha. É o preciosismo (mais disto à frente...) que faz a diferença: Tarantino recria não um filme, mas uma ideia de cinema e de género. Onde cabem - funciona assim com ele - todos os filmes em potência.
Cada segmento de Inglourious Basterds - ou deveríamos falar em "capítulos", como num romance? - é escrito, desenvolvido, filmado, montado como um filme autónomo, ou com potencial, de personagens, de narrativa, para se desenvolver como um filme autónomo. Cada um expondo e revelando ao que vem como quem abre uma caixa de surpresas. E assim passamos de capítulo em capítulo, de golpe de teatro em golpe de teatro, numa progressão a que só não sucumbimos exaustos porque Quentin é mais caloroso do que exibicionista e filma com papel e caneta, como quem escreve o seu romance. Contagiante e inteligente espectáculo este. Que, em vez de ser espectáculo da acção, é espectáculo da palavra. Os diálogos e as legendas são a matéria do drama, a matéria com que se faz a II Guerra em Inglourious Basterds. Que é um filme falado tanto em francês como em alemão, como em inglês. Onde quem sabe as línguas todas está em condições de dominar (mas tanta legendagem complicará a vida aos americanos, isso é mais que certo)."
Ou seja, Vasco Câmara fala muito bem do último Tarantino. Confesso que estava um tanto céptico quanto a este "Inglourious Basterds", mas sendo assim, e esperemos mais opiniões, fico ainda mais curioso e expectante.
Para rematar, o crítico do Público escreve: "E agora, uma frequently asked question de 2009: porque é que bastards deu em basterds, qual é a coisa do "e"? "É um floreado artístico que não posso explicar. Jean-Michel Basquiat tirou um L da palavra Hotel e colocou-o num quadro seu. Se ele fosse a explicar porque é que fez isso..." Não é preciso dizer mais..."
E se por um lado temos Tarantino, um dos nomes mais sonantes do "novo cinema", por outro temos um vanguardista, um nome aclamado e respeitado na história do cinema, um senhor que pisou pela primeira vez Cannes há 50 anos, Alain Resnais. "Les Herbes Folles" é o seu novo trabalho e ao que parece, traz um Resnais actual.
Mais uma vez, Vasco Câmara diz: "Pelo contrário, é muito mal educado, porque é inclassificável, Les Herbes Folles, de Alain Resnais, (...) Mas Alain Resnais é um cineasta de hoje. Com os seus actores habituais (Sabine Azéma e André Dussolier) a liderarem um cast onde está uma outra geração de intérpretes franceses, como Emmanuelle Devos, Mathieu Amalric ou Sarah Forestier, e sempre a partir de um material dramatúrgico, quer seja romance ou peça de teatro, que não tem problemas em habitar zonas contíguas aos encontros/desencontros da comédia de boulevard, Resnais filma a formação (e aniquilação violenta) de um par.
O acaso, o roubo de uma carteira, coloca Azéma e Dussolier, que tudo, até a idade, indicaria estarem sentimentalmente "arrumados", em rota de colisão (é literal, a comédia vira tragédia). Como se seguisse um fio em que a loucura se vai improvisando, à imagem da vegetação que teima em crescer, espontaneamente, nas fendas do cimento, Resnais segue essa história de desordem - como lhe chamar: de amor? Resnais escreve, pinta e gesticula com o seu cinema, com a sua câmara. Faz teatro, faz filme caseiro e faz produção da Hollywood clássica, simulando "happy ends" sinfónicos. Faz um filme não domesticado, selvagem."
E dito isto, o que esperar? Resnais é Resnais e confesso que dou preferência a este em detrimento de Tarantino.
6 comentários:
Resnais é Resnais. Alguns dos filmes dele estão entre os meus favoritos (Marienbad, Hiroshima, Smoking).
Mas confesso que esta último 'Coeurs', com os seus separadorezinhos cheios de neve, absolutamente pirosos, não me convenceu de facto.. Espero sinceramente que tenha sido um percalço - e, a avaliar pelo que é dito na imprensa, parece que temos um regresso aos tempos de 'L'anée dernière a Marienbad'. Se isso se confirmar, fica aqui prometido que, na sala de cinema onde acontecer a exibição, eu vou para a frente da tela, nú, fazer uma pose de Jesus Cristo crucificado, durante todos os créditos finais, enquanto canto o 'Lay Me Low' do Nick Cave com o sotaque do Alberto João Jardim.
Aquele abraço. O teu blog continua em grande.
G.J.
Também não lhe achei muita piada (falo do Coeurs). L'anée dernière a Marienbad é outra categoria e é mesmo o meu filme preferido dele, embora também goste muito do Hiroshima. E isso é que era, termos com este Les Herbes Folles um regresso do melhor Resnais.
Pagava para ver a pose de JC crucificado :)
Obrigado pelo elogio.
Um grande abraço para ti também.
Sem dúvida. Resnais é Resnais.
Porém, de Cannes o filme que quero mais ver nem é de Tarantino ou de Resnais: é o novo Michael Haneke (e também, muito, o tão polémico "Antichrist" de Trier)
Pois Victor, o novo do Haneke parece ser um forte candidato à Palma de Ouro. Também tenho bastante curiosidade em vê-lo (a ver se voltou em grande depois do desnecessário remake do seu Funny Games) e ao do von Trier também, mas Resnais é daqueles senhores que sempre me deixa "em pulgas", assim como o Loach. Quanto ao Tarantino, já tive mais vontade de ver um filme dele.
O Tarantino continua a deslumbrar os críticos do Expresso - hoje o Francisco Ferreira diz mesmo que a Palma de Ouro deveria ser para ele. Aguardemos...
O Vasco Câmara relativamente ao Tarantino costuma ser bastante gracioso, logo prefiro esperar, porque pode não estar assim tão bom.
E concordo plenamente. De Resnais já não se duvida.
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