24 de novembro de 2012


"Que é "autobiográfico" é evidente, na medida em que reproduz o percurso do próprio Iosseliani, que também chegou a um ponto - nos anos 80 - em que se fartou das complicações levantadas pela censura na URSS e passou a fazer os seus filmes em França ("Os Favoritos da Lua" foi, justamente, o seu primeiro filme francês). Mais ainda, a ironia melancólica - e nunca cínica, nunca ácida - com que Iosseliani faz o relato deste percurso coincide com um dos motivos fundamentais dos seus últimos filmes, o tema da viagem e da decepção no fim do caminho, como se todos os lugares fossem mais ou menos equivalentes e as mesmas coisas se passassem, mais ou menos, em todos os lugares."

Luís Miguel Oliveira

22 de novembro de 2012


Na imensidão da luz e da lírica progressão narrativa na qual Ford se embrenha em quase todos os seus filmes, é cedo que se percebe que “Pilgrimage” é coisa tão plena e tão cheia de romantismo tanto quanto a mais arrebatadora história de amor, coisa que transborda tanto amor e tanto obscurantismo que desse amor brota, cedo é, também, que pressentimos que a coisa caminha a passos largos e galopantes para uma tragédia onde toda a culpa e toda a remissão virão abalar e, logo, acalentar a alma daquela mãe fria e “obsoleta” que embrenhada nas sombras e nas trevas vindas dum dos maiores dos egoísmos e dos ciúmes possíveis na história do cinema que o amor tornado obsessão tanto assusta. No espaço e no tempo se maneja tudo, como naquele quadro inicial em que Hannah e Jim nos são apresentados envoltos numa espécie de névoa e de aura fantasmática, como tudo do espaço e do tempo virá aquilo que do que foi se assemelhará. Lição das lições: só nos outros ou na vida dos outros se aprenderão, vistas de fora e não de dentro, daí resulta a remissão que ela abraçará no momento final em que a angústia e o tormento e o maior dos maiores dos arrependimentos não se aguentam mais. É na luz que o rosto dessa mãe, que atira o seu único e amado filho para a morte por causa da cegueira do ciúme e da possessividade, se mostra tão frio e tão assustador, momento final – de remissão e aceitação do que causou e do que ficou – a luz tudo mostra para se ver que aquele rosto fantasmagórico e assustador se transformou num doce e feérico e acalentador que tudo fará para que a culpa e o arrependimento não a consumam mais. “Pilgrimage”, filme-família como tantos outros de Ford, filme da luz e das trevas, do amor e do ódio, da culpa e da remissão, da obsessão e da possessão...

6 de novembro de 2012


“Finis Terrae” do Epstein rasga, rompe, abre todo o caminho que o cinema levará, rolará e pasmará e desbravará para sempre como tudo se desbrava na ferida do mundo como da ferida no dedo de Ambroise brotará toda a maldição que aquela garrafa partida lançará com ele até que a navalha perdida julgada roubada seja encontrada e tudo e todo e qualquer impossível seja tentado, como naquele momento final do “Tabu” do Murnau em que Matahi tudo luta e tudo e tanto nada para num esforço final e inglório alcançar o barco que lhe leva a sua amada, também aqui, “Finis Terrae” ou terra final de que mil metáforas possam ser feitas, em que, mais que a coragem e a firmeza em salvar Ambroise, se irrompe a ânsia e o propósito da remissão de Jean-Marie. E na maldição se mergulha, ainda que nos ritos e nos usos e costumes daquele povo se erga a grande (ou uma das grandes) objectividade de “Finis Terrae”, na comoção laboral que do orgulho e da destreza tudo virá como deles tudo ruirá para bem perto da morte caminhar, é da remissão que tudo e toda a alma de Ambroise se glorificará, fim do tormento nascido do engano, fim da escuridão e da solidão e da acção errante do homem, coisas que ao vento se dão para no vento voltarem como da névoa e da tempestade tudo brotará e toda a raça e destreza e vontade e determinação do homem em fazer e singrar a justeza das coisas e do mundo que do impossível tudo se ergue e tudo se faz tal qual o Matahi do Murnau fez...

1 de novembro de 2012

Nanook of the North - Robert J. Flaherty (1922) *****
The Big Parade - King Vidor (1925) ® *****
Finis Terrae - Jean Epstein (1929) ® *****
Det Regnar på vår Kärlek - Ingmar Bergman (1946) *****
Raw Deal - Anthony Mann (1948) *****
Way of a Gaucho - Jacques Tourneur (1952) *****
The Far Country - Anthony Mann (1955) *****
La Ciociara - Vittorio De Sica (1960) *****
The Call of the Wild - William A. Wellman (1935) ****
L'assassin habite... au 21 - Henri-Georges Clouzot (1942) ****
Strange Impersonation - Anthony Mann (1946) ****
Balkan Ekspres - Branko Baletic (1983) ****
Death At A Funeral - Frank Oz (2007) ****
Hell Is for Heroes - Don Siegel (1962) ***
L'Ennui - Cédric Kahn (1998) ***
Pelísky - Jan Hřebejk (1999) **
Solaris - Steven Soderbergh (2002) ® *


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