9 de julho de 2025





La chambre verte (1978, François Truffaut)
Queimada (1969, Gillo Pontecorvo)
Svadba (2000, Pavel Lungin)
Walesa. Czlowiek z nadziei (2013, Andrzej Wajda)



ao rever la chambre verte de truffaut, porventura o seu filme mais negro e mórbido, adentro na sua peculiaridade de metamorfosear o luto numa espiral ritualística e "odisseica" de perpetuação da veneração do morto na prevenção do esquecimento; assim, neste belíssimo e tristíssimo truffaut, debate-se a memória dos mortos como oposição (nele, em julien) à vida e ao seu percurso natural no post-mortem, em especial no renascer do amor carnal; é logo no início, em que truffaut diz ao marido acabado de enviuvar que os mortos estão vivos em nós, que la chambre verte se desdobra no que virá - a sombria memória que assombra aquelas almas -, para falar do amor eterno como uma rejeição da vida...

em queimada, a dada altura josé dolores, o zé ninguém que se torna general dos revolucionários, diz a outro escravo que a liberdade tem de ser conquistada, e aparte a troca (propositada ou não) da espanha por portugal (nunca tivemos colónias nas antilhas), queimada expõe a colonização como instrumento político, paradoxo da civilização, que perdura até aos dias de hoje com o nefasto exemplo israelita em curso; é particularmente interessante, e contrastando com o anacronismo (ou o que se lhe possa chamar) já referido, que pontecorvo ateste a origem anglo-saxónica do modus operandi de promover revolucionários (e revoluções) para os tais regime changes, na altura ainda colonizers changes...

já em svadba, comédia romântica fortemente influenciada pelo cinema de kusturica, nada de muito relevante se lhe pode atestar, salvo a relativa competência no género e na senda "kusturiqueira", assim como walesa de wajda se perfaz um interessante biopic sobre a figura lendária do líder sindicalista e mais tarde primeiro presidente polaco do pós-comunismo.

1 de junho de 2025


últimas coisas vistas:

 




 Hai shang chuan qi (2010, Jia Zhang-ke)
Les créatures (1966, Agnès Varda)
Le voleur (1967, Louis Malle)

31 de maio de 2025

 

1978, Killer of sheep, Charles Burnett


| a alienação das ovelhas afro-americanas | 



killer of sheep é coisa tão crua quanto melancólica; se há nesta obra-prima de charles burnett coisa que deva ser realçada é a melancolia da resignação que convive diariamente com o tédio e a irascibilidade contida (e controlada) das suas personagens; e se, aparentemente, não se passa nada em killer of sheep, ou se o seu neorrealismo apostado em dissecar a pobreza e a letargia daquelas “ovelhas” afro-americanas desagua no aparente “não se passa nada”, é-o superficialmente e para quem não consegue descortinar que ali se passa tudo o que burnett quer dissecar; assim, o que em killer of sheep poderia ser usado como manifesto político, é puramente social, numa clara alusão à alienação (até no sentido metafórico do título) daquela gente, bem como se afasta de qualquer romantização do objecto filmado; depois, aquela banda sonora é absolutamente maravilhosa!

 

28 de maio de 2025

 

1964, Nothing but a man, Michael Roemer 


 "It's just like a lynchin'. Maybe they don't use a knife on you, but they got other ways" 



talvez, e este talvez tem muita força, a grande virtude de nothing but a man seja a forma como evita beatificar e diabolizar o negro e o branco respectivamente, conseguindo não só fugir ao sensacionalismo, como evitar a desmesurada dramatização da discriminação e do racismo; assim, mergulha na crueza da sua linguagem cinematográfica e narrativa para suster o ímpeto apelativo do oportunismo temático, nunca cedendo a histerismos ou a sentimentalismos bacocos; é, portanto, na sua crueza, que nothing but a man me lembra o wanda da loden, na mesma análise directa e crua, sem embelezamentos, daquela américa profunda, no sul, onde o preconceito e o racismo persistiram mais tempo; ironia das ironias, mas apenas à primeira vista, num filme onde o sul preconceituoso e palco “maior” da escravatura no seu tempo é tão bem descrito e retractado, o seja por um judeu e não por um negro – o que nos mostra que há mais em comum que distintamente; 

nothing but a man, naquilo que ao seu sentido humanista reclama, combate até ao seu final pelo orgulho de um negro que entra em conflito com a estabilidade familiar, onde a resignação trará um futuro ainda que no seio da discriminação racial; aí, no seu direcionamento para a humanização da sociedade em si, mesmo a discriminatória, roemer distancia-se assim da violência (não foge, não a evita, apenas se distancia), tanto física como psicológica – e se ela se manifesta é a espaços e simbolicamente, como nos copos que se partem ou nas tensões criados nos confrontos; é, por isso, que nothing but a man é mais um estudo sociológico que um filme político, onde a carga emocional é gerida eximiamente e o racismo é preterido pela análise da sociedade em si, herdeira dos preconceitos e das regras discriminatórias que na época (obtenção da lei dos direitos civis, prémio nobel da paz a martin luther king, etc) sofreriam um abalo social com as transformações que viriam; absoluto, obrigatório.

26 de maio de 2025