2 de fevereiro de 2009

The Wrestler



Esta mais recente obra de Aronofsky é uma das grandes injustiças da edição dos Óscares deste ano, mas não é surpresa a Academia de Hollywood ignorar um filme como “The Wrestler”, pois é uma produção independente e a violência que perfaz todo o filme nunca agradou a Hollywood.
“The Wrestler” traz-nos uma análise minuciosa do mundo do Wrestling. Mostra-nos a violência que todo o espectáculo acarreta, o companheirismo entre os lutadores, os movimentos combinados, a auto-flagelação em prol do espectáculo, enfim, mostra-nos os bastidores do Wrestling. Aronofsky traz-nos a história de Randy Robinson (The Ram) (Mickey Rourke), uma estrela do Wrestling, que vinte anos após o seu auge como lutador profissional luta agora em lugares de baixa categoria. Embora o seu auge tenha passado, The Ram continua a ser um ídolo para os fãs do Wrestling, desde crianças a adultos e para os seus companheiros que o vêem como um professor ou mestre entre eles. Aronofsky retrata-nos o submundo da luta livre americana de forma soberba. The Wrestler oscila entre o espectáculo da luta livre americana e a personalidade de um lutador, que já em decadência tem um ataque cardíaco que dita o seu afastamento da única coisa que sabe e quer fazer. Aronofsky mostra-nos os truques, os segredos, os podres do Wrestling, enquanto nos conta a história de Randy fora desse mundo que ele tanto gosta. É aqui que o filme se expande psicologicamente, com Rourke a encarnar na perfeição um homem solitário, não só pelas circunstâncias da vida, mas também pelas suas próprias escolhas. Aronofsky pretende nos mostrar, e penso que não é para generalizar, a incompatibilidade do Wrestling para com uma vida estável emocional e familiar. Por outro lado, quando o inevitável chega, e por inevitável refiro-me ao ter que abandonar o ringue, este homem solitário e desajeitado tenta reconstruir relações que outrora não se preocupou em sustentar, neste caso a relação com a sua filha Stephanie (Evan Rachel Wood). E quando este tentar de aproximação e reconquista da relação pai/filha que há muito se perdera falha, esta alma errante que Aronofsky nos tenta fazer crer que apesar de querer construir; aqui com a stripper Cassidy (Marisa Tomei); e reconstruir relações emocionais e familiares que tragam algum sentido à sua vida após a dura realidade do abandono, quando toda esta manobra de substituição daquilo que realmente fazia sentido na sua vida falha, este escolhe arriscar/sacrificar a vida em prol de um estado psicológico que lhe traga algum conforto emocional e prazer físico. Ou seja, o wrestling era na sua essência aquilo que o definia e o fazia estar bem consigo próprio, na realidade era a sua própria vida. Privado do Wrestling, Randy desespera e tenta compensar com o tempo perdido, com relações que nem ele próprio acredita terem sucesso. Por isso, num pequeno/grande esforço no reaproximar da filha que lhe traz esperanças num futuro radioso, mesmo sem poder lutar, após esse esforço com sucesso Randy perde-se no seu mundo e perde mais uma vez a oportunidade de concretizar esse sonho duma relação saudável de pai e filha. É aqui que percebemos que este homem solitário, desajeitado e perdido (após deixar de lutar), não será nunca capaz de manter uma relação, apesar de a ansiar e procurar. É depois deste insucesso em criar laços com a filha, que Randy tenta mais uma vez estabilizar a vida, desta vez profissionalmente, quando arranja um trabalho num supermercado. Mas, tal como nas relações em que não consegue mantê-las, também aqui Randy mostra que não consegue aguentar uma vida normal. Aronofsky cria aqui o momento perfeito para nos definir a essência e a personalidade de Randy, quando um homem o reconhece no supermercado e ele nega a sua identidade. Aqui, ao interiorizar que ainda é um ídolo do wrestling para muita gente, Randy simplesmente desiste de tentar ser mais um “Zé-ninguém” trabalhador de um super-mercado. É aqui que percebemos que Randy gosta de ser um ídolo, que gosta de ser conhecido e de ser famoso. Quando percebe que mesmo noutra profissão ainda é reconhecido, questiona-se o que faz ali, reconhece apesar da tentativa em contrário que o seu lugar é na luta livre, que isso é a sua vida e que sem o wrestling não vale a pena viver. Descobrimos assim que, a sua paixão pela luta e por aquele estilo de vida era mais forte do que qualquer relação, amorosa ou familiar. Penso até que essa paixão pela luta era mais forte que ele próprio.
Este é um filme com uma grande carga emocional, violento, cru e realista. O argumento de Robert Siegel é muito bom e a prova disso é ser um dos pontos fortes do filme, bem como a fotografia, a realização de Aronofsky e as interpretações de Mickey Rourke e de Marisa Tomei, ambos nomeados para o Óscar de Melhor Actor e Melhor Actriz Secundária, respectivamente. Este The Wrestler é para mim um dos melhores filmes do ano de 2008 a par de Gomorra e The Curious Case of Benjamin Button, sendo assim necessário expressar aqui o meu desagrado à sua ausência na categoria de Melhor Filme e Melhor Realizador na Academia de Hollywood.

5 comentários:

Filipe Machado disse...

Um dos filmes mais esperados do ano! Antevejo mais uma obra prima do génio de Aronosky! Excelente crítica! Parabéns!

Álvaro Martins disse...

Obrigado Filipe. Para mim, é o melhor do ano.
Outra coisa, ainda é cedo, mas começo a acreditar que Aronofsky é o novo Kubrick. Espero bem que não desiluda no futuro.

Unknown disse...

Bom texto.

O Aronofsky nunca me desiludiu, vamos ver agora com este...

Fernando Ribeiro disse...

Não podia estar mais de acordo contigo Álvaro. Também acho uma tremenda injustiça este filme ter sido esquecido pela Academia. Mas enfim, agora não há nada a fazer. Sinceramente, e apesar das minhas elevadas expectativas antes de ver o filme, pensava que o filme iria ser só Mickey Rourke. Mas, felizmente, não foi isso que aconteceu. Principalmente devido à excelente realização de Darren Aronofsky. E não nomearem Evan Rachel Wood ao Oscar de Melhor Actriz Secundária foi algo que também não percebi. Bela crítica. Parabéns! :)

Abraço.

Álvaro Martins disse...

Obrigado pelos elogios a todos.

Fernando:
também gostei muito do filme embora seja o pior dos 4 do Aronofsky.
Quanto à Evan Rachel Wood, gostei da interpretação mas aceito a sua não nomeação. Agora para melhor filme e melhor realizador...isso já é outra história.

Abraços