12 de setembro de 2010

Солнце - Solntse - O Sol (2005)










Estranho poder que Sokurov quer explorar em Solntse (como já o fizera em Molokh). Mas aqui tudo é diferente, excepto talvez a intenção em filmar a relação do imperador com o mundo e a realidade com que se vê confrontado à semelhança do que fizera com o ditador alemão em Molokh. E, se em Molokh Sokurov procurava analisar uma relação entre o ditador e o mundo/realidade, como que fazendo uma introspecção individual do ditador no reconhecimento deste na sua posição mundial (digamos no seu poder) explorando a loucura e a morbidez do ditador, em Solntse o cineasta russo tenta “mexer” com a reacção e postura do imperador japonês face à realidade confrontada (a iminente derrota militar/rendição imediata aos americanos). Em Solntse o russo filma (actualmente há poucos (ou nenhuns) a fazer esteticamente o que ele faz) aquilo que parece ser um tipo de candura inerte relativa à realidade em questão. Sokurov faz de Hirohito uma figura culta e, sobretudo, interessada na ciência e poesia. De certa forma, Sokurov transmite um lado muito humano ao imperador japonês, nunca descurando os seus privilégios e comodidades afectas a alguém da sua natureza. Mas sobretudo a rejeição de qualquer moralidade ou culpabilidade pelas atrocidades da guerra. Sokurov abstrai-se de qualquer pretensão dessa natureza (cita, inclusivamente, durante uma das conversas entre Hirohito e o general-chefe americano, a rejeição de ambos na participação (leia-se inclusive autoria) dos casos de Pearl Harbour e Hiroshima). Na verdade, o russo cria no imperador um certo desconforto na sua relação com as pessoas inerente à sua condição social e mítica. A diferença que Sokurov conclui entre Hirohito e Hitler (e são muitas), além de toda a natureza do poder em questão (que é o grande objecto de estudo aqui), é sobretudo a definição intelectual e humana das duas figuras históricas. Ou melhor, a relação “homem/poder” que ambos partilham mas que cada um a sustenta à sua maneira. Ou seja, resumindo, Sokurov faz de Hirohito alguém capaz de abdicar desse poder (em parte) em prol do povo, da paz e da prosperidade do seu país enquanto faz de Hitler o inverso. Humaniza um e desumaniza outro.

Sokurov é, actualmente, único na composição plástica e formal do seu cinema. A forma como usa as cores e as sombras é, não só ímpar como espantosa. A descendência do cinema de Tarkovsky assim o permite (e aqui temos tanto de Tarkovsky, do seu naturalismo e da sua contemplação). Mas a influência na mise-en-scène de Tarr e de Fassbinder também salta à vista, os seus movimentos de câmara, os morosos planos-sequência e seus rodopios sobre o personagem.
Solntse é, acima de tudo, um regalo para os sentidos, um grande filme.

3 comentários:

Anónimo disse...

O melhor dos 3 é o Taurus.

Álvaro Martins disse...

Ainda não vi esse. Já agora (e agradecia que te identificasses) não sabes onde se arranjam legendas em português p'ra isso?

Álvaro Martins disse...

Ou quem souber eheh