1 de setembro de 2010

Ампир - Ampir (1987)



O que Sokurov faz em Ampir é descurar toda a simbiose da natureza humana num monólogo (“confundido” com diálogo) entre esforços inúteis de evitar o inevitável. Força indignada da expressividade, fúria do ser enclausurado pelo espaço a que está confinado. Hermeticamente gélido e belo, visualmente pálido e enegrecido pela ontologia do cinema de Sokurov. Sim, Ampir é tudo isso e muito mais em meia hora de puro cinema. O que Sokurov cria naquele espaço onde, um sépia enegrecido dá corpo a uma expressividade e teatralidade só comparável a Dreyer, é toda a ontologia do seu cinema e deontologia do próprio cinema.

Ampir, curta-metragem baseada na peça de rádio Sorry, Wrong Number da escritora americana Lucille Fletcher, é como se fosse um Godot que tarda em aparecer (que acaba por nunca aparecer). Ao invés, em Ampir, aquilo que acaba por suceder é o que presumíamos mas recusávamos aceitar. Ou seja, previsibilidade das previsibilidades. Mas Ampir ofusca qualquer previsibilidade que se possa entender. O que está em causa em Ampir é a força expressiva da peça, o desmesurado enclausuramento que o próprio espaço transparece e faz de Ampir muito mais que um pequeno thriller. É toda a metáfora que aquele elegante caixão no meio daquele requintado quarto remete para a morte e a vida. O simbolismo da morte em vida (o caixão). Qualquer coisa como isto!

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