18 de setembro de 2010

Au Hasard Balthazar (1966)



















Numa terra onde a fé não se apresenta mais que uma fantasia de crianças e num mundo sem espaço para Deus, a humanidade entrega-se a si mesma, tomando toda a responsabilidade pelo seu fatídico destino. E Bresson não hesita, nesta simples alegoria lírica, em esclarecê-lo sob o olhar protagonista de um burrinho chamado Balthazar, santificado e divinizado até onde seria possível. Ver o naturalista e ascético Au Hasard Balthazar é, duplamente, sentir poesia em estado bruto e redefinir a perspectiva sobre a nossa própria existência. Isto porque a jornada “dúmbica” do burro, que assiste, em paralelo com as narrativas sociais que confluem com a dele, não é mais que uma contemplação do horror e crueldade humanas, do absurdo a que se fica sujeito desde a nascença. Mas o espectador não é livre de culpa. O espectador é parte, diria quase activa, daquele sofrimento e de toda aquela ridicularização e barbaridade, muito simplesmente por deixar que a desumanização prossiga com uma aparente e vil naturalidade. E a comoção que se nos dá, e as lágrimas que se deixam cair naquele esperado fim com o Bem rodeado do rebanho do Mal, tão certo como o correr de um rio, não são mais que os evidentes sinais de que é preciso, com urgência, rever a nossa fé, o nosso destino, a nossa estrada e o nosso final. Sim… grande, grande filme.

em O Sétimo Continente por Flávio Gonçalves


*E este post "acelerou" o meu visionamento do filme.

6 comentários:

João disse...

O texto do Flávio está muito bom

Ainda bem que o viste! Foi o meu primeiro Bresson.

Flávio Gonçalves disse...

Ena, Álvaro, muito obrigado! :) Obrigado aos dois pela referência ;)

Este filme foi uma surpresa.

Álvaro Martins disse...

Também achei o texto muito bom João. O meu primeiro Bresson foi o Un Condamné à Mort S'est Échappé, que continua a ser o meu preferido.

Flávio, para mim não é que tenha sido surpresa, já esperava algo assim do Bresson, mas sim é um grande filme. E não precisas de agradecer, eu é que agradeço a oportunidade de postar o teu texto, está muito bom e achei que eu não tinha mais nada a acrescentar.

Manuela disse...

Tenho que ver este filme. Deve estar para breve.;)

Anónimo disse...

gostei muito desse teu blog! vou visitalo sempre! achei muito bonita a menina das fotos desse filme! vou pesquisar pra saber mais sobre ela e sobre esse filme que com tanto carinho descreveste! Marcos Punch.

Álvaro Martins disse...

Marcos, o texto não foi escrito por mim e sim pelo Flávio do blog O Sétimo Continente como está referido no post. Fico contente que tenhas gostado do blog e és sempre bem vindo :)

Manuela, eu também andei muito tempo a adiar mas fiz mal porque é mesmo um grande filme. Vê o quanto antes ;)