L’Humanité trata do que o título diz, a Humanidade. Mas L’Humanité foge a todos os convencionalismos a que estamos habituados. Todos. L’Humanité é um cinema puro, limpo. Seja nos planos, nos enquadramentos, na imagem em geral, L’Humanité é limpo, sem artifícios, sem embelezamentos, sem maquilhagem. Porque o que Dumont quer mostrar são as imperfeições humanas, o ser humano como ele é. E Bruno Dumont foge aos diálogos. Como diria alguém que me tem aconselhado grandes filmes e cineastas (ele sabe quem é), Dumont filma o vazio. E filma esse vazio de forma simples, crua. Mas Dumont filma sobretudo o instinto humano. Animalesco, primitivo. A violência, o sexo, o desejo carnal. O sexo é sem dúvida o instinto mais explorado pelo cineasta francês, como catalisador desses instintos animalescos do Homem, como entrega do ser humano a esse primitivismo (por isso os planos das vaginas – a da vítima logo no inicio do filme e posteriormente a de Domino). E tudo resume o vazio daquele local, daquelas pessoas. O vazio cultural, social e interior (Domino e Pharaon passam os dias – horas pós-laborais – à porta de casa um ao lado do outro. Domino alimenta o desejo de Pharaon por ela, aceita o sexo, a dada altura oferece-se a ele, mas recusa envolvimentos.).
E Dumont lembra Bresson com o seu minimalismo, a sua procura nos detalhes. Só tenho pena de não ter visto esta maravilha há mais tempo.
5 comentários:
Acredita que é muito bom filme. Há algo no filme de belo, mas uma beleza intransponível, estranha. É muito cru, muito minimalista, com uma veia muito realista, muito crítica na apatia, no quotidiano. E com uma conotação sexual muito forte. Acredito que vais gostar ;)
Para mim, nem é essa «realidade íngreme é crú» que vale a pena ressaltar: é a personagem do Pharaon, que de resto ganhou o prémio em Cannes. Do que me lembro, porque o L'Humanite já é um velho amigo, aquela personagem atormentada é a mais «menos respondida» que conheço na história do cinema. Aquele grito no campo quando está a passar o comboio para que não o ouçam, quando ele sai de bicicleta, aquele plano também está cheio de símbolos, quando ele beija o negro na esquadra, um dos supostos criminosos... é extraordinária a capacidade, como uma «grande-mãe» da Humanidade que o Pharaon, um homem solitário e atormentado pelo passado e pelo que o rodeia (que parece-me ser como que um deja-vu de cenas que não vemos, de toda a vida de um homem. quantas vidas tem a vida?), a capacidade, como estava a dizer, de sentir compaixão e raiva, delirio e uma calma inaudita, orgulho e humildade... nng consegue entrar, apenas perceber que o filme, como o ego humano, é tudo, desde que não se veja. Assim é a arte também.
Depois o filme foi quase todo interpretado por pessoas não-actores, sem formação, como o próprio Pharaon, que lhe dá uma genuínidade simplesmente incrivel. Como aliás, foi habitual nos 90, por influência da cena avant-garde norte-americana, do Dogma95. O Emmanuel Schotté não precisa de muito para entrar na personagem, já tem todos os traços, é só deixar fluir os pecados.
Se quiseres mais grandes filmes e realizadores «psicológicos», é só pedires. ;)
Estás à vontade para recomendações ;)
Assim... conheces Atom Egoyan?
Conheço. Já vi há uns aninhos o Sweet Hereafter, que gostei muito. Tenho aqui o Where The Truth Lies, o Ararat e o Adoration, mas ainda não os vi.
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