15 de outubro de 2009

No Quarto da Vanda (2000)

Um filme de Pedro Costa














Quando encontrou as Fontaínhas e aqueles com quem encontrou uma hipótese de família, como disse, filmar era devolver-lhes qualquer coisa...

Era dar-lhes o cinema. O cinema dá-lhes muitas coisas, só não lhes dá dinheiro, comigo...

Mas admite que a recepção aos seus filmes tem sido acompanhada pelo questionamento de uma suposta contradição: fazer da miséria um objecto artístico. Aceita isso?

Jamais, jamais. Comecei "O Quarto da Vanda" com a mesma energia, cegueira e ambição com que comecei "O Sangue". Tinha feito "Ossos" e "Casa de Lava" (1994), filmes de transição. Tinha-me preparado para saber se o filme era possível ou não. Sentia-me bem ali [nas Fontaínhas], via laços que se estavam a criar entre mim e pessoas, coisas, ideias. Tal como n' "O Sangue", lancei a minha própria ficção para lançar o "Quarto da Vanda". Uma noite, eu e a Vanda falámos sobre o que é que valia a pena fazer depois do "Ossos". Acho que isto é uma pequena ficção criada por mim. Lembro-me de ter dito: "Isto é demasiado cansativo, não estou para isto", e ela dizer-me: "Se calhar pode fazer-se de outra maneira, fica aí, há um quarto, há pessoas que gostam de ti, aparentemente gostas de estar cá, deves gostar de filmar cá, filma, mas arranja outra maneira". Isto foi uma pequena ficção para lançar o filme. E fiz o meu caminho nas Fontaínhas, completamente solitário, tive de aceitar coisas, tocar nas dificuldades, na moral que se põe quando se está num sítio daqueles, que é muito cru, extremado. E tive que fazer esse caminho. Isso era de facto contraditório, mas precisava de o resolver antes de começar a filmar.


Pedro Costa

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