Noventa anos após a descoberta dos irmãos Lumière, deixou de ser possível afirmar, seriamente, que o cinema não é uma arte. Será então presunção pensar que há, na história do cinema, cerca de cinquenta filmes que são tão preciosos como a Ilíada, o Pártenon, a Capela Sistina, a Gioconda ou a Nona Sinfonia, e cuja destruição empobreceria de modo idêntico o património artístico e cultural da humanidade? Sim, talvez, porque uma tal afirmação parecerá audaciosa àqueles que persistem em considerar o cinema como uma «divertimento de hilotas» (Georges Duhamel): é fácil responder que, se certas pessoas desprezam o cinema é, com efeito, porque ignoram a sua beleza e que, mesmo assim, é absolutamente irracional ter por desprezível uma arte que é, socialmente falando, a mais importante e a mais influente da nossa época.
Mas é preciso reconhecer que a própria natureza do cinema fornece muitas armas contra ele.
O cinema é fragilidade porque está ligado a um suporte material extremamente delicado e que acaba por se estragar com o uso; porque só há muito pouco tempo é que se encontra protegido pelo depósito legal e porque o direito moral dos criadores quase não é reconhecido; porque é considerado, antes de tudo, uma mercadoria, e porque o possuidor tem o direito de destruir os filmes como muito bem entender; porque está submetido aos imperativos dos comanditários e porque em nenhuma das outras artes as contingências materiais têm tanta influência sobre a liberdade dos criadores.
O cinema é futilidade porque é a mais jovem de todas as artes, nascida de uma vulgar técnica de reprodução mecânica da realidade; porque é considerado pela imensa maioria do público como um simples divertimento onde se vai sem cerimónia; porque a censura, os produtores, os distribuidores e os exibidores cortam os filmes à sua vontade; porque aas condições do espectáculo são tão lamentáveis que no sistema de sessões contínuas se pode ver o fim antes do começo, projectado numa tela que não corresponde ao formato do filme; porque em nenhuma outra arte a concordância crítica é tão difícil de atingir e porque todas as pessoas se julgam autorizadas, tratando-se de cinema, a se considerarem juízes.
O cinema é facilidade porque se apresenta, a maioria das vezes, sob as aparências do melodrama, do erotismo ou da violência; porque consagra, em grande parte da sua produção, o triunfo da imbecilidade; porque é, nas mãos das potências económicas que o dominam, um instrumento de embrutecimento, uma «fábrica de sonhos» (Ilya Ehrenburg), «rio fugaz desbobinando à farta quilómetros de ópio óptico» (Audiberti).
Deste modo, vícios profundos contrariam o desenvolvimento estético do cinema; e, para além disso, um pecado original vergonhoso pesa sobre o seu destino.
Mas é preciso reconhecer que a própria natureza do cinema fornece muitas armas contra ele.
O cinema é fragilidade porque está ligado a um suporte material extremamente delicado e que acaba por se estragar com o uso; porque só há muito pouco tempo é que se encontra protegido pelo depósito legal e porque o direito moral dos criadores quase não é reconhecido; porque é considerado, antes de tudo, uma mercadoria, e porque o possuidor tem o direito de destruir os filmes como muito bem entender; porque está submetido aos imperativos dos comanditários e porque em nenhuma das outras artes as contingências materiais têm tanta influência sobre a liberdade dos criadores.
O cinema é futilidade porque é a mais jovem de todas as artes, nascida de uma vulgar técnica de reprodução mecânica da realidade; porque é considerado pela imensa maioria do público como um simples divertimento onde se vai sem cerimónia; porque a censura, os produtores, os distribuidores e os exibidores cortam os filmes à sua vontade; porque aas condições do espectáculo são tão lamentáveis que no sistema de sessões contínuas se pode ver o fim antes do começo, projectado numa tela que não corresponde ao formato do filme; porque em nenhuma outra arte a concordância crítica é tão difícil de atingir e porque todas as pessoas se julgam autorizadas, tratando-se de cinema, a se considerarem juízes.
O cinema é facilidade porque se apresenta, a maioria das vezes, sob as aparências do melodrama, do erotismo ou da violência; porque consagra, em grande parte da sua produção, o triunfo da imbecilidade; porque é, nas mãos das potências económicas que o dominam, um instrumento de embrutecimento, uma «fábrica de sonhos» (Ilya Ehrenburg), «rio fugaz desbobinando à farta quilómetros de ópio óptico» (Audiberti).
Deste modo, vícios profundos contrariam o desenvolvimento estético do cinema; e, para além disso, um pecado original vergonhoso pesa sobre o seu destino.
Marcel Martin in Le Langage Cinématographique (1955)
1 comentário:
Grande texto. E já era assim, desde então.
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