8 de novembro de 2009

Antichrist (2009)

Um filme de Lars Von Trier

















Antes de mais, e admitindo que existem neste “Antichrist” cenas chocantes e, diria até, viscerais, o novo filme de Lars Von Trier não é assim tão visualmente ofensivo (exceptuando duas ou três cenas) a ponto de causar desmaios como aconteceu no New York Film Festival. Mas, polémicas e susceptibilidades à parte, “Antichrist” é realmente um grande filme.
Mais importante que toda a polémica, que todas as opiniões acerca do dinamarquês proclamando-o de sádico ou perverso, mais importante que tudo é perceber que “Antichrist” reincide no mesmo tema que “Breaking The Waves” e “Dancer in The Dark”, o tema da dor. E “Antichrist” é certamente aquele que mais explora visualmente e psicologicamente essa dor. Mas se alguém me diz que Von Trier exagerou com toda a provocação gráfica e detalhe sexual visualmente explícito, eu digo veja “Riget” e depois continue a dizer que “Antichrist” é uma obra repulsiva.
Mas, continuando, Lars Von Trier gosta de explorar a dor, o sofrimento, a angústia. E tal como em “Breaking The Waves”, onde Bess entrava num conflito interior acerca do bem e do mal, do que é ou não pecado (graças ao ambiente rígido e preconceituoso em que Bess está inserida), “Antichrist” reflecte também nesses temas, na definição do bem e do mal, no que é normal e anormal. E se “Breaking The Waves” pretendia desafiar convencionalismos ou moralidades religiosas, “Antichrist” vai mais longe. Até porque visualmente é completamente o oposto. E se “Dancer in The Dark” apresentava uma Selma frágil, inocente e pura que cai na tragédia, aqui Von Trier cria dor noutro estado. Aqui, Von Trier explora uma complexidade espiritual e sexual que acaba por criar sentimentos opostos. Porque o cineasta dinamarquês resolve criar simbolismos, resolve criar uma espécie de caos mental. E se após a morte do filho o sentimento que arrasa a mãe é o sofrimento, a loucura vai apoderar-se dela até nascer dentro dela uma raiva incontrolável.
Trier divide o filme em 6 capítulos que são Prólogo, 1º Capítulo – Sofrimento, 2º Capítulo – Dor (O Caos Reina), 3º Capítulo – Desespero (Genocídio), 4º Capítulo – Os Três Mendigos e Epílogo. É assim que Lars Von Trier decide apresentar “Antichrist”, dividindo as fases que levam a personagem de Gainsbourg a percorrer o caminho desde o início de uma depressão causada pela morte do filho até à loucura.
Mas “Antichrist” revela-se como uma obra negra. O dinamarquês tudo faz para assim o ser. E mais que negro, “Antichrist” é essencialmente um filme cru (apesar de toda a beleza cinematográfica de Anthony Dod Mantle). Além do mais, o filme é niilista com toda a ausência de definições do bem e do mal e com todos os simbolismos criados. Sim, porque esse conflito que é criado e que origina a instabilidade mental e emocional que leva à loucura dela nunca é claramente explicado. Se por um lado vemos que antes da morte do filho já ela sofreria de alguma perturbação mental, somos ainda confrontados com o colapso sofrido após a morte do filho e que logo a seguir ao despertar origina aquilo que dá nome ao primeiro capítulo, o sofrimento (ou depressão). Mas “Antichrist” transporta ainda o medo que o casal tenta vencer com a terapia indo para o Éden. E o filme transcende-se na procura de respostas. Respostas que estão escondidas na natureza, natureza essa que aqui personifica o mal, o mal humano. Esse conflito entre bem e mal, entre o correcto e o errado, entre sanidade e insanidade invadem “Antichrist” desde o primeiro minuto do filme (a morte do filho – início do filme – acontece no acto sexual do casal).
“Antichrist” explora a dor, o sofrimento, o medo, a loucura, a sexualidade. E Trier fá-lo agressivamente, visceralmente e controversamente. Mas, independentemente de tudo isso, “Antichrist” é indubitavelmente um grande filme.

7 comentários:

João disse...

Gostei da tua análise, parece que estamos de acordo, Antichrist é um grande filme :)

Roberto Simões disse...

Olha Álvaro, antes de mais, parabéns pela crítica. Está muito bem desenvolvida; foi uma leitura prazerosa.
Ainda não vi o filme, vou esperar pela tardia estreia de Janeiro. Mas estou ansioso.

Cumps.
Roberto Simões
CINEROAD – A Estrada do Cinema

Tiago Ramos disse...

Ainda não tinha lido uma crítica a Antichrist que condensasse tão bem aquilo que achei do filme. Excelente filme!

Unknown disse...

Óptimo texto, concordo com tudo o que referes. É um dos grandes filmes do ano, como já tinha escrito no meu blog.

Já agora, Álvaro, que filme é esse de que falas - "Riget"?

Unknown disse...

Ainda não vi. Espero pela oportunidade para poder comentar.

Mas que tenho curiosidade, tenho.

Abraço

Álvaro Martins disse...

João,
estamos mesmo de acordo ;)

Roberto,
obrigado. Quando puderes vê logo porque é sem dúvida um dos melhores filmes do ano.

Tiago,
ainda bem que gostaste. Sim, é um grande filme.

Victor,
obrigado. Sim, é um dos grandes filmes do ano e quanto a mim dos melhores do Lars Von Trier.

Riget, ou em português O Reino, foi uma mini-série que o cineasta dinamarquês fez há uns anos dividida em 2 temporadas. Na altura até passou na rtp2.

Fifeco,
é muito bom. Apressa-te a vê-lo ;)

Unknown disse...

Estou muito ansiosa para deitar a unhaca a esse.