8 de junho de 2011

Wanda (1970)
Barbara Loden

Wanda, filme de culto não só por ser a única longa-metragem dessa mulher que teria muito mais a dar não lhe fosse ceifada a vida por um cancro em 1980 (assim como a sua carreira de cineasta que além deste Wanda nada mais viu a luz do dia, excepto duas curtas-metragens em 75), mulher ou esposa de um dos grandes nomes do cinema clássico norte-americano, Kazan, mas também porque Loden faz com Wanda o que Kazan não fez em nenhuma das suas obras. Em Wanda é tudo tão cru e tão arcaico ou anacrónico, rudimentar, coisa com grão que é coisa que desagrada à maioria dos cinéfilos (ou àqueles que se julgam cinéfilos), sem embelezamentos visuais, sem quaisquer resquícios de sensacionalismos ou de facilitismos. É tudo tão desmesuradamente real, forte, psicologicamente violento, sombrio e tão prestes a eclodir toda essa violência. Subversivo. Mas nada de violento se passa, ou de explicitamente violento, até porque de violento só mesmo Mr. Dennis. Em Wanda encontramos o que parece ser uma mulher letárgica, frustrada, desolada, sem rumo, uma alma perdida e errante (assim como Mr. Dennis), apostada em ser “levada” ou “arrastada” pelos homens com quem se relaciona, uma mulher que procura refúgio ou um certo tipo de liberdade nos homens que encontra, nas relações que assume com tanta facilidade, como se procurasse uma companhia mas quisesse sempre a sua liberdade que afinal não é mais do que a sua letargia, coisa duma dissidente que não sabe o que quer, que acredita que é melhor estar morta (como diz a dada altura), que vagueia sem rumo atrás daquele homem que lhe rouba as réstias dalguma dignidade e moralidade que ainda tinha. Wanda é literalmente uma inútil (novamente palavras dela), mulher que não se importa com o divórcio e que relega a tutela dos filhos ao pai - eles estão melhor com ele - diz ela. Como diria Mozos, Wanda “é um retrato frágil e singular, magnífico e vigoroso de uma sociedade triste e pardacenta, indiferente aos loosers que ela própria criou e que não se encaixam no American Way of Life.” O final, aquele final tão brutal quanto o próprio filme e sobretudo quanto toda a caminhada de Wanda para esse final onde naquele momento todo o terror da consciencialização da sua realidade e da sua própria letargia e erradicação do mundo e da sociedade é coisa tão brutal quanto lírica, tão dolorosa quanto bela, tão cheia de resignação quanto de sacrifício. Wanda é filme de culto porque é mais que um simples filme, é uma das melhores obras que já se fez na América.

2 comentários:

My One Thousand Movies disse...

100% de acordo contigo Álvaro :)

Manuela disse...

Muito bom! Também concordo em absoluto com a tua apreciação.

Bjs