21 de março de 2010

Flandres (2006)

















Mais do que toda a crueza no cinema de Dumont, mais do que toda a crueldade, mais do que toda a dureza, mais do que o vazio, existe sobretudo a frieza com que Dumont retracta o ser humano. Porque o seu cinema é frio, pessimista. Se olharmos para L’Humanité e Twentynine Palms vemos sempre essa frieza, essa desumanização do mundo e do ser humano. E Flandres vem no seguimento dessa aposta, na linha duma agressividade que o cineasta quer mostrar. Se L’Humanité (e ainda me falta ver La Vie de Jésus) explorava os conflitos sociais, o vazio daquela comunidade, Twentynine Palms já se dirigia para um conflito interior (que também vemos em L’Humanité) e, essencialmente, um conflito nas relações pessoais, naquele casal. E Flandres traz isso tudo, traz esse vazio e essa desumanização do interior francês onde nos apresenta os campos verdes e cinzentos na procura da natureza, traz depois a barbaridade, a verdadeira ausência de humanidade na guerra, naquele deserto amarelo duma guerra não identificada. E aqui somos levados a perceber que Dumont não distingue essa desumanização. Porque tanto naquele interior francês onde aquela mulher se deixa caminhar em direcção à loucura, como na guerra, o cineasta quer mostrar sempre a falta do humano, a crueldade e o instinto animalesco a que o ser humano é próximo. E o sexo e a morte sempre lado a lado, porque ambos surgem da violência, da crueldade humana. E a vida em Dumont é como algo imposto, onde a sobrevivência reina, onde se resume a uma banalidade rígida. Mas o mais importante no cinema de Dumont é a sua isenção, a falta de parcialidade ou de condenação por parte da câmara. Somos apenas meros espectadores de toda a violência física e psicológica que Dumont apresenta. Não há castigos nem remorsos, porque no cinema de Dumont a própria vida é por si só um castigo. Frio, duro, cru e cruel, assim é o cinema de Dumont.

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