4 de abril de 2025





 

2016, The road to Mandalay, Midi Z 


The road to mandalay, na sua pequena odisseia da procura de uma vida melhor na ilegalidade do país vizinho, é no fundo uma história de amor, que desde o início – e espaçada pela sonoridade adjacente e condizente a tal – anuncia a tragédia que chega no final; coisa realista, midi z analisa a luta pela sobrevivência da emigração ilegal, numa incessante busca pela legalização, a corrupção, a exploração e as injustiças inerentes a todo o processo, mas lá no fundo, bem no fundo deste conto nevrálgico do fatalismo, está o amor, a decepção e a obsessão que determinará o encontro da tragédia; muito bom.

3 de abril de 2025

 


 

| neorrealismo aliado ao romantismo em busca da cisão entre o desejo carnal e o amor cristalino; terreno de conflitos interiores... trevas tortuosas |

 

1951, Anna, Alberto Lattuada

31 de março de 2025

30 de março de 2025

 


2010, Au fond des bois, Benoît Jacquot


Sobre au fond des bois do jacquot, filme assombroso que remete para o desejo mas que se desdobra numa complexidade notável, é de realçar a forma como o cineasta francês explora o poder da sedução e a fragilidade do seduzido; numa metamorfose desenvolvida progressivamente, que parte do fantasmático e do encantamento, au fond des bois analisa a capacidade do poder mental (e do olhar) e da altercação do poder; se é timothée quem rapta e força joséphine a segui-lo e a ter relações com ele por meios encantatórios, progressivamente observamos a passagem do comando dele para ela, sugerida mais tarde pelo fórceps hipnótico de joséphine desafiar a dor e a morte, culminado no final de ascendência “joséphiniana”; é nessa alternância (que se estende à temporalidade e à sociedade em si, tendo joséphine como símbolo dessa evolução social), na fragilização do raptor/feiticeiro (o feitiço mata o feiticeiro) pela crescente obsessão por joséphine, como se à medida que o desejo se torna amor a fragilização acontece, que au fond des bois se revela na sua maestria, deixando-nos ainda no final a dúvida de ter sido sempre ela a sedutora; magnífico!

 

2002, Être et avoir, Nicolas Philibert
2010, Au fond des bois, Benoît Jacquot

29 de março de 2025

 

1987, Matewan, John Sayles 


| carvão vermelho | 

Em matewan, filme de mineiros (ou sobre eles) e da luta de classes, longe daquele lirismo e daquele sentimentalismo do ford de how green was my valley, mas próximos do realismo do malick do days of heaven e do pioneirismo do cimino de heaven’s gate ou do huston de sierra madre, o folk é a perfeita sonorização para um filme de época em transição do velho oeste para uma era progressiva. 

Op sumptuosa que na sua crueza oscila entre o western e o que se lhe seguiu, estamos ainda naquela américa mítica dos caminhos de ferro, mas também dos xerifes e alguns cavalos, américa profunda ao sul (west virginia), embarcamos nessa transição do velho oeste para o novo onde a máquina capitalista está em seu pleno furor; conjuntura política que definiria o que (ainda) são hoje os estados unidos, falamos do ressurgimento socialista e do apogeu comunista um pouco por todo o mundo, revolução russa, alemã (falhada), na itália seriam esmagados pelo aparecimento do fascismo, é sobretudo bakunin quem é citado por joe, um anarquista a servir de modelo a um sindicalista chamado de vermelho (comunista); é no sindicalismo que o novo vem substituir o velho, ou na luta dele, o sentido pioneiro de todo o filme abarca não só a sua ambiência e o seu espaço como também esse detalhe da temporalidade, que aqui é dual com essa transição - e matewan está no epicentro dessa transição. 

Ora, se o velho oeste ainda lá está enraizado em matewan, cidade mineira que à exploração está habituada, quase tudo pertence à companhia mineira, os direitos são trabalhar e calar, a desumanização do trabalhador, é nessa sindicalização que o progresso se faz ver, inclusive na erradicação do racismo que apenas serve como factor divisório do trabalhador, é a luta de classes que é priorizada, os homens dividem-se em dois diz joe: os que trabalham e os que não; é portanto no realismo que matewan se apresenta, no realismo e na luta social num sul ainda a braços com a sua transformação. 

A igreja, a fé, isso surge ainda em matewan como catalisador (e prova da conciliação) da luta de classes, como se a fé renovasse as forças (e a clarividência: lembremos o momento em que danny salva joe através da pregação na missa) daqueles trabalhadores ameaçados e escravizados pelo capital, como se ela, a fé, fosse o catalisador dessa resistência pela justeza laboral e social e assim gritasse ao mundo: não, a fé não é inimiga da classe trabalhadora!




28 de março de 2025

 

1955, Un eroe dei nostri tempi, Mario Monicelli 




| la paura | 

Sordi em un eroe dei nostri tempi personifica na sua plenitude a desprezibilidade no homem, interpretação magnífica a atestar a sua grandiosidade como actor, o eterno cobarde e neurótico-maníaco que rege a sua vida segundo um medo incompreensível e uma timidez risível, fruto da criação/educação de mãe e tia; monicelli faz de un eroe dei nostri tempi uma sátira extremamente divertida e fluente, nada devendo às screwball comedys americanas, onde a flutuação entre o anedótico e a análise político-social (a crítica ao capitalismo está lá, à autoridade também) convivem em perfeita sintonia.


| 1959, La grande guerra, Mario Monicelli | 


Monicelli é daquela nata de cineastas italianos que são muitas vezes esquecidos e depreciados face aos consagrados, no entanto ofereceu-nos autênticas ops assombrosas como é o caso deste la grande guerra; entre o neoralismo e a comédia, monicelli consegue em la grande guerra, como em tantos outros filmes seus (i compagni por ex), humanizar os seus personagens oscilando entre a coragem e a cobardia, a honra e a vileza, o patriotismo e a ausência dele; magnífico.

27 de março de 2025



 

1957, The lonely man, Henry Levin 
2023, Légua, João Miller Guerra & Filipa Reis