14 de julho de 2025


 Distant voices, still lives (1988, Terence Davies) 



| nostalgia melancólica | 


em distant voices, still lives somos confrontados com a ausência de linearidade temporal onde a memória é o motor fulcral que nos lança nas lembranças nostálgicas (e autobiográficas do cineasta) e lancinantes e que partem da disfuncionalidade familiar; em torno da figura paternal, base capilar da disfuncionalidade referida, do autoritarismo à brutalidade, seguimos para a construção daquelas vidas jovens (os filhos), assombradas pela paradoxal relação pai/filho(a) em que o amor e o ódio se entrelaçam, e davies fá-lo tão liricamente quanto musicalmente… e tão belíssimo, tão monumental é distant voices que o filme acaba e a sua melancolia parece continuar em nós… e é nas memórias que a música adquire o seu verdadeiro sentido, é nela que as vozes distantes do título (as memórias) se evocam; terence davies não apenas carrega em distant voices o sentido nostálgico e da crueza dum passado amargo e cinzento, e por isso o filme nunca cai na tentação de se agarrar e se perder no melodramático em si, ao invés mergulha nessas memórias que a nostalgia reclama numa odisseia pelas rotas tanto da amargura como da ternura e dos momentos de felicidade; é, assim, essa nostalgia que distant voices transpira e que, não obstante, venha a maior parte das vezes acompanhada da melancolia, que supera em si a tentação do facilitismo dramático (e de outros facilitismos, um deles o do ritmo) e enverede pelo realismo de uma vida, a qual abarca não só essa amargura retractada (e não só a questão disfuncional paterna como as dificuldades económicas próprias da classe trabalhadora inglesa dos meados do século passado) como os seus momentos de alegria e de felicidade; distant voices, still lives nunca opta por histerismos ou por grafismos numa apelação ao sensacionalismo, e é admirável que assim seja, ao invés segura em si a sobriedade do seu objecto, carrega no lirismo melancólico e nostálgico que o move e produz em si um portento de filme; belíssimo.

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