30 de janeiro de 2009

Elia Kazan



Elia Kazan (Elias Kazanjoglou de nome de família) nasceu a 7 de Setembro de 1909 em Constantinopla (actual Istambul, na Turquia) no seio de uma família grega e morreu a 28 de Setembro de 2003, em Nova Iorque. Aos quatro anos, emigrou para Nova Iorque. Nos anos trinta projecta-se como encenador de peças da Broadway no circuito nova-iorquino, o que lhe dá oportunidade de ir para Hollywood. No começo da Guerra Fria, os artistas, argumentistas e realizadores comunistas ou pro-comunistas são alvos duma perseguição, conhecida como a caça às bruxas. Foi aqui que Elia Kazan, que militou no partido comunista entre 1934 até 1936, cedeu. Para que o libertassem dos interrogatórios no Comité de Investigações de Actividades Anti-Americanas, colaborou com os agentes macarthistas, revelando nomes de ex-companheiros, sendo estes interrogados e presos. Com a polémica instalada e a fama de traidor estabelecida na sua pessoa, Kazan decide inaugurar, nos anos 50, um subgénero dramático, a contemplação do traidor.
Foi nomeado, pela Academia de Hollywood, cinco vezes na categoria de Melhor Realizador pelos filmes Gentleman’s Agreement (1947), A Streetcar Named Desire (1951), On the Waterfront (1954), East of Eden (1955) e America, America (1963), tendo ganho a estatueta por Gentleman’s Agreement e On The Waterfront. Recebeu ainda uma nomeação na categoria de Melhor Filme e outra de Melhor Argumento pelo filme America, America. Em 1999, a Academia de Hollywood entregou-lhe o Óscar Honorário em reconhecimento da sua carreira no cinema. Nos Globos de Ouro, recebeu quatro prémios como Melhor Realizador pelos filmes Gentleman's Agreement (1947), On the Waterfront (1954), Baby Doll (1956) e America, America (1963). Recebeu ainda dois prémios Bodil como Melhor Filme Americano por On The Waterfront (1954) e East of Eden (1955). No Festival de Cannes, foi galardoado com o Prémio de Melhor Filme – Drama por East of Eden (1955), enquanto no Festival de Berlin lhe entregaram o Urso de Ouro Honorário em 1996. Por fim, no Festival de Veneza foi distinguido com o Leão de Prata por On The Waterfront (1954), o Prémio Especial do Júri por A Streetcar Named Desire (1951), recebeu o Prémio Internacional por Panic in The Streets (1950) e recebeu o Prémio OCIC por On the Waterfront (1954).

Filmografia

1937 - The People of The Cumberland (curta-metragem)
1945 - A Tree Grows in Brooklyn (Laços Humanos)
1947 - The Sea of Grass (Terra de Ambições)
1947 - Boomerang!
1947 - Gentleman's Agreement (A Luz é Para Todos)
1949 - Pinky
1950 - Panic in The Streets (Pânico Nas Ruas)
1951 - A Streetcar Named Desire (Um Eléctrico Chamado Desejo)
1952 - Viva Zapata!
1953 - Man On a Tightrope (Os Saltimbancos)
1954 - On The Waterfront (Há Lodo no Cais)
1955 - East of Eden (A Leste do Paraíso)
1956 - Baby Doll (A Voz do Desejo)
1957 - A Face in The Crowd (Um Rosto na Multidão)
1960 - Wild River (Rio Violento)
1961 - Splendor in The Grass (Esplendor na Relva)
1963 - America, America
1969 - The Arrangement (O Compromisso)
1972 - The Visitors
1976 - The Last Tycoon (O Último Magnata)

29 de janeiro de 2009

"O cristianismo desenvolve-se num terreno absolutamente falso, onde toda a natureza, todo valor natural, toda a realidade, tinham contra si os mais profundos instintos das classes dirigentes, uma forma de inimizade para com a realidade, inimizade de morte que ainda ninguém ultrapassou. O "povo eleito", que para todas as coisas apenas conservara valores de padres, palavras de padres, e que separou de si, com uma lógica implacável, como coisa "ímpia, mundo, pecado", tudo o que restava ainda de potência sobre a Terra, este povo criou, para os seus instintos, uma última fórmula, consequente até à negação de si próprio: acaba por renegar, no cristianismo, a última forma da realidade, o "povo sagrado", o "povo dos Eleitos", a própria realidade judaica. O caso é de primeiríssima ordem: o pequeno movimento insurrecional, baptizado com o - nome de Jesus de Nazaré, é uma repetição do instinto judaico, por outras palavras, do instinto sacerdotal que já não suporta a realidade do padre; é a invenção de uma forma de existência ainda mais retirada, duma visão do mundo ainda mais irreal do que aquela que a organização da Igreja estipula. O cristianismo nega a igreja.
Não vejo contra quem pudesse ser dirigida a insurreição da qual Jesus, talvez sem razão, passou por ser o promotor, senão contra a Igreja judaica, Igreja tomada exactamente no sentido que hoje damos a essa palavra. Era uma insurreição contra "os bons e os justos", contra os "Santos de Israel", contra toda a hierarquia da sociedade; não contra a corrupção da sociedade, mas contra a casta, o privilégio, a ordem, a fórmula. É uma falta de fé nos "homens superiores", um não pronunciado contra tudo o que era padre e teólogo. Mas a hierarquia que, por esse facto, era posta em causa, nem que fosse por um só instante, era a morada flutuante, a única que permitia ao povo judaico existir no meio da "água", a última possibilidade de sobreviver dificilmente adquirida, o resíduo da existência política autónoma: um ataque contra esta existência era um ataque contra o seu mais profundo instinto popular, contra a mais tenaz vontade de viver que jamais se viu sobre a Terra por parte de um povo. Esse santo anarquista que chamava os mais humildes do povo, os reprovadores e os pecadores, os Chandalas do judaísmo, à resistência contra a ordem estabelecida - com uma linguagem que, ainda agora, a acreditar nos Evangelhos, levaria à Sibéria –, esse anarquista era um criminoso político, pelo menos tanto quanto um criminoso político era possível numa comunidade absurdamente impolítica. Foi isso que o conduziu à cruz: a prova disso é a inscrição que se encontrava no cimo da mesma cruz. Ele morreu por causa dos seus pecados – não há qualquer razão para se pretender, embora muitas vezes se tenha pretendido, que ele morreu pelos pecados dos outros."

Friedrich Nietzsche
"O ANTICRISTO"