3 de maio de 2017

Austerlitz do Loznitsa é no fundo uma coisa desconcertante, ainda que não o pareça… e para o espectador comum, ou menos atento, não será fácil descortinar isso, Loznitsa faz algo desconcertante no sentido em que a sua constante procura e “fixação” nas pessoas (os turistas) ao invés dos monumentos, dos locais, do “sítio”, nos mostra o lado obscuro não da história e das atrocidades do holocausto à qual todo o filme está impossibilitado de fugir (ainda que se veja claramente que é esse o propósito de Loznitsa, fugir à história, e por isso sim também lá está essa obscuridade inerente), mas sim do lado obscuro que do turismo e da curiosidade das pessoas advém. A ideia que Austerlitz me deu foi que Loznitsa quer mostrar, naquele “mais um dia” de visitas turísticas a um campo de concentração nazi, alguma coisa obscura ou um sentido caricato/irrisório (ou talvez filosófico) naquela exploração turística de algo tão negro e tão demoníaco como foi o holocausto e como isso interessa e atrai as pessoas… e portanto daí a sua procura incessante nelas… nas pessoas, nos gestos, nos rostos, nos comportamentos, nas reacções, na procura das pessoas em tirar fotos, selfies, em documentar a sua passagem por ali (redes sociais como finalidade provavelmente)… é tudo tão bizarro, estranho, dado o contexto do local… ainda que a espaços nos traga explicações de guias acerca dos locais por onde passam, Austerlitz parece-me essencialmente filme sobre as pessoas e a sua relação com aquilo que se visita e se vê e sobre esse sentido quase que infame ou desonroso quer da exploração turística do local quer da abundante procura das pessoas neste. O resultado é algo simples, fascinante e desconcertante.

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