










Aqui, em Trilogia: O Vale dos Lamentos, no apoio à tentativa dessa exploração da História Grega da primeira metade do séc. XX, Angelopoulos conta a história trágica duma mulher, Eleni. Mais que trágica é uma história romântica, melodramática e sofrível. É essencialmente o retracto dum amor, da luta por esse amor proibido que nasce ainda na adolescência. As repressões morais, éticas e sociais da época e daquela comunidade de exilados que chegara a Tessalónica no virar do séc. XX, retornando à pátria oriundos duma Rússia em revolução, originam a fuga destas duas almas enamoradas e desejosas de viver livremente esse amor. E esse amor vai enfrentar as contrariedades dessa primeira metade do séc. XX. Eleni e Mihalis enfrentam a pobreza, o fascismo, as guerras (mundial e civil), as repressões, a distância, a perseguição social daquela comunidade. A tragédia de Eleni é, de certa forma, uma metáfora ao sofrimento/tragédia da própria Grécia, ao povo grego. A água (mais uma vez) figura como metáfora do pranto daquela mulher/Grécia, a inundação daquela comunidade traz, além de simbolismos religiosos (não é à toa que se inunda logo após o massacre dos carneiros que vemos pendurados numa árvore, seguido do plano do chão onde Angelopoulos nos mostra o sangue dos animais – símbolo da culpa do casal pela morte do pai), como também essa alusão directa com o choro duma Grécia sofrível, duma Grécia que atravessou nessa primeira metade do século dificuldades a todos os níveis. Angelopoulos relaciona sobretudo Eleni com a pátria, com a alma ferida da Grécia.
E, como em todo o seu cinema, Angelopoulos filma magistralmente. Estão lá os planos-sequência dilatados e lentos que são já típicos do grego, planos belos que tentam imergir numa relação espaço/tempo a que aquelas personagens permanecem sempre próximas, tempo esse que Angelopoulos parece querer estender ao máximo nesses mesmos planos. E o enquadramento da câmara, a destreza daqueles travellings, a comunhão dos planos com a magnífica música de Karaindrou, a poesia esbarrada naqueles diálogos existencialistas, a liturgia daqueles movimentos de comunidade após inundação, etc. O Vale dos Lamentos é um filme absolutamente admirável, grandioso, épico. Fenomenal.
5 comentários:
Tanta coisa boa para ver...!
:) O que é que já viste de Angelopoulos Flávio?
Nada :P
At this point já me deves achar burro por não conhecer nada. Mas eu recolho todas as sugestões com prazer e muita ansiedade. Cmo, por exemplo, este aqui...
Não Flávio, nunca pensei isso. E muito menos por não se conhecer, eu também não conheço tudo, bem pelo contrário, ainda tenho muito cinema para ver ;)
Quanto às sugestões, obrigado pela parte que me toca, é bom saber que alguém considera as minhas opiniões :)
E penso que, visto que gostaste de Tarkovsky, também vais gostar de Angelopoulos. Não que seja o mesmo tipo de cinema, não o é, mas Angelopoulos vai buscar muita coisa a Tarkovsky. Por exemplo, a forma de filmar é bastante semelhante, a contemplação e o naturalismo estão lá, são ambos cineastas poéticos embora cada um com o seu estilo de poesia, etc. Eu acho-o um dos grandes da actualidade, ao lado de Tarr, Sokurov, Lynch, Kiarostami, Bartas, Malick, Dumont e mais uns poucos ;)
Pronto, então. Obrigado eu :p
Hei-de ver este em breve :)
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