11 de abril de 2013


Velhice solitária…

Primeiro McCarey visto, deslumbramento total. “Make Way for Tomorrow”, como as tais palavras dum sábio citadas no primeiro minuto do filme, “honra o teu pai e a tua mãe…”, é filme que busca a gratidão (ou a reclama) dos filhos pelos pais, ainda que chegue ao fim sem a encontrar... e não há filme mais doloroso e mais lancinante para com a velhice que este (excepto os grandes Ozus), não há filme mais brutal e mais negro (de tão tristíssimo que se prenuncia) na procura da retribuição ou da equidade do amor ou do carinho ou do afecto dos filhos pelos pais, isto porque alcançamos o final e percebemos que não a há, que a velhice se augura solitária e ingrata. Não há redenção possível, respeita-se e segue-se; como um caminho por onde seguir adiante seja inevitabilidade das inevitabilidades, coisa da lógica e da lei da vida; a amargura da velhice e a rejeição máxima a que se cola a ingratidão e a frívola compaixão e a falta de dignidade humana daqueles filhos a quem os pais são o maior dos maiores dos estorvos do mundo.

Separação…

Se há coisa que “Make Way for Tomorrow” tem, é a tal brutalidade e a tal negrura de toda a temática abordada. Além da velhice e da solidão a que o casal da película está destinado, McCarey vai mais longe e separa-os, arranja um problema financeiro ao qual lhe dá um sentido social (tudo derivado da Grande Depressão) e despeja o casal da sua casa de sempre para, ingratos e desnaturados, os filhos os separarem com a desculpa da vida e do espaço limitado em suas casas. É nesse contexto da separação do casal que o caos e a desumanidade e toda a negrura que vem da tristeza mais melancólica de todos os mundos se colocam e desabam toda a estabilidade familiar que outrora os suportou (à família), a estabilidade que educou e criou aqueles filhos que, agora, casados e dispersos por aquela América das grandes cidades, votam e destinam os pais a uma humilhação e a uma vil "mendigação" pelo lar dos seus filhos… e se há coisa que “Make Way for Tomorrow” reclama é a dignidade do ser humano, e por isso aquela mãe prefere ir para o lar do que continuar a estorvar os filhos, se há coisa que existe é a inexorabilidade da vida, da velhice, é o futuro incerto daqueles velhos separados pela leviandade e pela futilidade dos seus.

Nostalgia…

Ao reencontro surge a inevitabilidade das memórias do que não volta, surge a nostalgia dum passado que, após estes anos todos, se revela ser ainda o presente, tudo mudou mas ainda assim algo perdura e se mostra imutável, o amor deles, coisa que, e a maior descoberta daqueles dois velhos abandonados e distantes é a de que o maior bem (e ao contrário do que se possa pensar) que um e o outro têm é o amor entre eles, pois os filhos, esses, nada fazem para os honrar, os filhos, que outrora eram tudo o que de melhor possuíam, tudo fazem para os enxotar e afastar das suas vidas, como se aqueles velhos, que tudo deram e toda a vida lhe deram, fossem agora coisa dispensável e descartável. É essa negrura e coisa terrífica que se assinala como verdade absoluta, os filhos crescem e partem, formam eles próprios a sua família, deixando aqueles que os criaram ao abandono e ao destino da velhice. Por isso no final fica a nostalgia, ainda que curto, o reencontro, tão pungente quanto as mais pungentes tragédias gregas, é ainda assim oportuno e fortuito para os dois velhos solitários reencontrarem o amor na nostalgia do passado, nas mágoas e no calvário do presente e na incerteza do futuro.

2 de abril de 2013


“La Pivellina”, primeira ficção dos documentaristas Tizza Covi e Rainer Frimmel (tal como o russo Loznitsa que se aventurou também na ficção com o seu “Schastye moe” - e o último “V tumane” é dos filmes que mais anseio ver), é objecto tão realista quanto directo, tão lúcido e tão ternurento quanto brutal e frio, coisa que parte duma certa herança (que à medida que se desenvolve foge dela a "sete pés") do neo-realismo ou, se quisermos trazer o documental à baila e atribuir-lhe esse tal realismo que se procura em todo o filme, e dum olhar da câmara à mão (ou de restícios do Dogma 95 se assim o quiserem chamar), abstido de qualquer virtuosismo, perto da crueza e da rudeza, tudo pelo realismo, para contar uma história de afecto e de amor conquistado por uma criança abandonada encontrada por uma circense de meia-idade que nunca pôde ou nunca quis ter filhos. Passa-se todo o tempo à espera da mãe da criança (porque esta é mais uma boca para alimentar e um fardo para carregar) para no final carinho e apego gritarem mais alto e lamentarem, e lá no fundo reclamarem, a iminente ida da pequena Asia.

1 de abril de 2013

Four Sons - John Ford (1928) *****
Make Way for Tomorrow - Leo McCarey (1937) *****
Wuthering Heights - William Wyler (1939) ® *****
The Sun Shines Bright - John Ford (1953) *****
La Morte Rouge - Víctor Erice (2006) *****
The Sandpiper - Vincente Minnelli (1965) ****
Film d'amore e d'anarchia, ovvero 'stamattina alle 10 in via dei Fiori nella nota casa di tolleranza...' - Lina Wertmüller (1973) ****
La Pivellina - Tizza Covi e Rainer Frimmel (2009) ****
Stalingrad - Joseph Vilsmaier (1993) ***
The Town - Ben Affleck (2010) ***
To Rome With Love - Woody Allen (2012) ***
Django Unchained - Quentin Tarantino (2012) ***
Whisky Galore - Alexander Mackendrick (1949) **


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