18 de fevereiro de 2011

No cinema de Angelopoulos há tanto de belo como de político, uma força estrondosamente violenta que emerge e que explode ali nos nossos olhos, uma força tão crua e tão directa desse sentido político ao que se junta a procura (sempre a procura) duma viagem pela história quer política quer cultural da Grécia. Angelopoulos é acima de tudo um patriótico, orgulhoso da sua pátria, da sua Grécia, mas esse patriotismo é melancólico, é sempre transposto para o ecrã como um lamento ao seu povo. Por isso Angelopoulos é cineasta da melancolia acima de qualquer outra coisa. Tudo no grego transporta essa melancolia do passado, da história da sua Grécia. Tudo é sempre uma viagem melancólica à procura de explorar ou retractar ou dissertar sobre a história, sobre os episódios negros da história da Grécia. E esse orgulho da nação, essa quase que vaidade por ser grego, pela herança dos seus antepassados, isso tudo vem à tona do seu cinema quando (principalmente a partir do Megaleksandros) começa a trazer um sentido mitológico e alegórico para o seu cinema. Sim, há ali sempre o olhar político, sempre o olhar reaccionário (uma aproximação quase que directa ao marxismo, sobretudo na sua primeira trilogia), de lamento e melancolia mas de revolta pelos massacres e pelas guerras, de insurreição pelo sofrimento que o seu povo comportou, sim há sempre isso tudo em Angelopoulos, mas o sentido mitológico vem trazer um grito silencioso como que a individualizar ou engrandecer o povo, como que a imortalizá-lo e a pedir uma urgente libertação dessa condição opressiva. Tudo tão lírico, tão épico e tão belo, tudo tão forçosamente destruidor na sua génese, na sua beleza e no seu lirismo. Sempre a apontar o dedo ao capitalismo, ao fascismo, à corrupção, sempre nesse olhar político e sublevado, desgastado pela amargura numa melancolia e numa falsa quietude das imagens que emerge lá do fundo para irromper dissimuladamente, para ocultamente bradar ao mundo que basta de opressão e de dor. Qualquer coisa tão lírica e tão sensível naquela lentidão dos longos e distantes planos-sequência, na forma esplendorosa e deslumbrante como filma, qualquer coisa tão bela e tão desoladora na imensidão das imagens, na contemplação não só da natureza como da humanidade, dos movimentos do ser humano, dos olhares e das palavras, dos ideais, das formas. Tudo tão próximo de Tarkovsky e de Bresson, influências primárias no seu cinema. E isso está lá sempre em qualquer filme do grego, e por isso Angelopoulos é um dos maiores cineastas de todos os tempos.

2 comentários:

João disse...

Não conheço nada dele. Qual o seu melhor filme, ou qual o teu preferido?

Álvaro Martins disse...

Ui, sei lá...o meu preferido porque foi o primeiro que vi é o O Olhar de Ulisses com o Harvey Keitel, mas ainda não vi um filme dele mau, o Paisagem na Neblina é um portento de filme, O Passo Suspenso da Cegonha também, o A Eternidade e um Dia, O Vale dos Lamentos, Viagem a Cítera, O Apicultor com o Mastroianni, A Viagem dos Comediantes, tudo portentos de filmes, tudo coisa que muito cineasta com fama de grande não chega aos calcanhares no máximo da sua inspiração eheh mas não é para todos se é que me entendes ;) é como Tarr, é só para quem gosta mesmo de cinema porque caso contrário ao fim de quinze minutos desligam.